Mas sobre o quê? Passou-se o tempo em que eu entendia memes, ou sabia os lançamentos musicais. Passou-se o tempo em que eu devorava livros, ansiava por uma nova série, comprava ingressos antecipados pro cinema ou planejava o próximo show que iria. Passou-se o tempo em que eu sabia exatamente qual seria minha viagem e o que eu queria fazer.
Essas coisas me parecem outra vida... ah, pandemia, ok. Mas eu parei. Parei no tempo, no sentido, nada mais tem razão de ser. Os dias são opacos e sombrios, todos iguais. Cadê a luz, a alegria, a vontade de viver?
Em algum momento a luz se apagou. Provavelmente entre os inúmeros acontecimentos trágicos da minha vida. Mas então é sobre o quê? Respirar, fingir produzir algo, comer e dormir? Seria isto viver, no fim das contas?
Alguém me perguntou como que foi meu dia? Não, Chorão... Uma palavra amiga e uma notícia boa fazem muita falta no dia a dia. Mas talvez eu já não saiba mais nem o que é isso... talvez eu não saiba mais ser amiga. Só sei dar respostas automáticas pra perguntas retóricas, porque não, não tá tudo bem, tá tudo um desastre sem fim. Mas alguém tá bem?
Ao mesmo tempo, é justo comparar tudo com a dor dos outros? Dizem para que eu não me compare, mas então comparam minha dor... é sobre isso, afinal? É sobre o quê?!
Comparar minha dor é o mesmo que me comparar, é o mesmo que me colocar na caixinha de pessoas que tem problema nesse mundo e não se importar com o meu individualmente. Eu não quero tratamento especial, mas quero sim ser ouvida sem escutar que "todo mundo passa por algo" ou que "não nos dá fardo que não possamos carregar", porque eu me sinto confundida com o Rambo.
Acolher a dor não quer dizer concordar com o que eu digo, mas entender que minha fala reflete meu sentir e meu sentir é afetado por todas as minhas feridas, e estão todas abertas, jorrando sangue. E eu não estou errada em sentir, não posso estar errada nisso... porque aí eu só sou completamente errada. Acolher é só me deixar sentir, verdadeiramente me ouvir (e não apenas escutar esperando o momento de responder) e entender o porquê de me sentir assim, é saber de mim, conhecer a mim, e não essa imagem que uso diariamente pra dizer que "tá tudo bem".
Certa vez escrevi sobre a solidão de estar no meio de um monte de gente... agora não tem mais um monte de gente e eu sinto falta das vozes, porque as vozes externas apagavam o som das internas, que estão me sugando e eu só me sinto sozinha, solitária e morta, mesmo que o coração cisme em continuar batendo.
No final das contas, as vozes gritam: insuficiente, inútil, não vale a pena, rejeitada, invisível, ninguém nunca vai te ver, todos vão embora, sozinha, incapaz de ser amada. É sobre isso.